Com o calor já a apertar, e a primavera bem avançada, seria na tarde do passado dia 28 de maio que se realizaria a oitava visita da terceira edição da Rota das Árvores do Porto, que nos levaria a percorrer três espaços com dimensões e usos muitíssimo distintos da cidade: o pequeno jardim da Casa Museu Marta Ortigão Sampaio, originalmente privado e de carácter mais intimista, construído em 1958; o grande jardim público da Rotunda da Boavista, de inusitada configuração circular, projetado por Jerónimo Monteiro da Costa e concluído em 1906 e, finalmente, o vasto — e monumental — Cemitério de Agramonte, o mais antigo dos três espaços a serem visitados naquela tarde e o segundo mais antigo cemitério público portuense, inaugurado em 1855.

No jardim da Casa Museu Marta Ortigão Sampaio, fomos recebidos por uma nativa do sudeste dos Estados Unidos da América; uma venerável magnólia-de-flores-grandes (Magnolia grandiflora), de grandes e lustrosas folhas e que, curiosamente e, em boa verdade, infelizmente, não exibia ainda as estivais, alvas e muito aromáticas “flores grandes” pelas quais a espécie é afamada. A oportunidade de as admirar chegaria lá mais para o final da visita, onde voltaríamos a encontrar mais alguns exemplares da espécie. Abraçando o pequeno lago no centro do jardim, outras duas grandes árvores impunham a sua presença: a primeira, uma bonita nogueira-comum (Juglans regia), nativa da península balcânica e, hoje em dia, considerada naturalizada em território nacional, que, aqui e ali, exibia já os seus verdes e imaturos frutos, as “nozes ou bolotas de Júpiter” que farão as delícias de muitos no outono. A seus pés, estendia-se um esparso tapete de flores masculinas. Já na segunda, um vetusto cedro-do-atlas (Cedrus atlantica) um nativo, como o seu nome bem indica, da altaneira cordilheira do Atlas, no norte de África e em cujos ramos conseguimos observar os seus característicos cones, fazendo lembrar pequeninas barricas. Muito perto, vegetava um muito nobre e nacional loureiro (Laurus nobilis), cujas ramagens escondiam, ou ensombravam, um australiano eucalipto-vermelho (Corymbia ficifolia) que, tal como a magnólia-de-flores-grandes, não exibia ainda a sua fogosa e vibrante floração estival. Fazendo-lhe companhia estava uma asiática robustamente agarrada à terra; uma árvore-da-borracha (Ficus elastica), ladeada por uma outra vistosa australiana; uma árvore-do-papel, ou neve-de-verão, (Melaleuca linariifolia), assim designada quer pela sua casca, semelhante a finas folhas de papel de cor parda, quer pela sua profusa floração, composta por uma miríade de pequenas e perfumadas espigas de flores brancas. Igualmente muito perfumado, e originário da Mata Atlântica brasileira, por ali se encontrava também um delicado manacá-de-cheiro, ou de jardim, (Brunfelsia uniflora), exibindo ainda algumas das suas flores, conhecidas por mudarem de cor — de violeta-azulado a branco — com a passagem dos dias.

Esgotava-se assim o tempo dedicado a explorar este pequeno e belo oásis, meio escondido no vibrante coração da cidade mas agora aberto a todos os que o queiram visitar e dele usufruir. Seguimos, então, em direção ao jardim da Rotunda da Boavista, que nos aguardava, ansioso por mostrar o que de melhor tinha para nos oferecer nesta altura do ano.

Quem nos deu as boas-vindas foi um sedutor nativo do — literalmente — outro lado do mundo, um neozelandês metrosídero (Metrosideros robusta), exibindo por estes dias a sua frondosa copa engalanada por uma constelação de pequenos, e muito vistosos, pompons de delicadas flores vermelhas. Tanto ainda havia que ver… Assim, e apesar de completamente seduzidos, despedimo-nos e demos seguimento ao nosso passeio em torno do jardim, para logo encontrarmos dois ilustres carvalhos norte-americanos. Apesar da origem em comum, apresentavam indumentárias tão diferentes que não havia forma de os confundir: o carvalho-americano (Quercus rubra) cobria-se de grandes folhas oblongo-ovadas e levemente lobadas, já o carvalho-dos-pântanos (Quercus palustris) exibia a sua rendilhada folhagem, de menor dimensão e profundamente lobada. Quando o outono chegar, tanto umas como as outras prenderão o nosso olhar pelas suas belíssimas tonalidades cobreado-avermelhadas.

Dali fomos ao encontro de uma pequena tília-de-folhas-pequenas (Tilia cordata), europeia, que nos mostrou, não só, as suas pequenas folhas em forma de coração, como também as suas delicadas flores de coloração esbranquiçada e respetivas brácteas de coloração esverdeada. Continuando a circunavegação da rotunda, deparámo-nos com alguns azereiros (Prunus lusitanica), um dos mais belos representantes da flora nacional, exibindo, ainda, nas copas a sua profusa e característica floração composta por longos cachos compostos por pequenas flores brancas. Aproximando-se a floração já do seu final, vislumbravam-se, também e por esse motivo, os pequenos e imaturos frutos, ainda verdes e de formato semelhante ao das azeitonas. Na sua companhia estava uma elegante e multicaule tamareira-do-senegal (Phoenix reclinata), nativa da África tropical, Madagáscar e Península Arábica, e que, como o epíteto específico reclinata muito bem indica, tem tendência a inclinar-se, algo que ali pudemos confirmar. Tal como os frutos da sua parente tamareira (Phoenix dactylifera), os frutos (tâmaras) que a espécie produz são comestíveis. Fechando o círculo em torno do jardim, seria junto a um bonito conjunto de braquiquitos (Brachychiton populneus), nativos do este da Austrália, que dele nos despediríamos. Esta espécie, relativamente comum nos jardins mais antigos da cidade, é também conhecida como “arvore-garrafa” pela sua capacidade em armazenar água, ou também “arvore-dos-barquinhos” pelos seus frutos de formato semelhante ao casco de um barco. Apesar dos frutos, da cor do chocolate e repletos de sementes alaranjadas, estarem presentes nas copas das árvores nesta altura do ano, o que, então, mais nelas se destacava era a sua copiosa floração, composta por pequenas flores em forma de sino, de coloração verde-clara a rosa-pálido.

Após uma curta caminhada, detivemo-nos em frente ao grande portão do Cemitério de Agramonte. Ainda antes de entrar, pudemos admirar um conjunto de tulipeiros-da-virgínia-de-folhas-variegadas (Liriodendron tulipifera ‘Aureomarginatum’), cujas folhas, ao contrário das da espécie-tipo, se apresentam orladas a amarelo-pálido em torno de um coração verde. Nas suas frondosas e esbeltas copas observavam-se ainda algumas das pequenas e amarelo-esverdeadas “tulipas” que estão na origem do nome comum desta espécie norte-americana. Atravessámos, então, o majestoso portão do cemitério, em busca dos muitos monumentos verdes existentes neste monumental cemitério.

E a primeira paragem fez-se não muito tempo depois, junto a um deslumbrante e escultural cipreste-japonês (Chamaecyparis obutsa), da variedade ‘Nana Gracilis’, mais pequena e graciosa do que a espécie tipo e muito comum por todo o cemitério. Um também ele graciosíssimo cedro-do-atlas-de-folhas-azuis (Cedrus atlantica ‘Glauca’), nativo do norte de África, exibindo as suas invulgares agulhas de tonalidade azulada, marcaria a nossa segunda paragem, avistando-se, dali, um pequeno agrupamento de grandes mélias, amargoseiras ou conteiras (Melia azedarach), uma espécie asiática frequentemente avistada na cidade. Nesta altura do ano, espreitando por entre as suas folhas semelhantes às dos freixos, avistavam-se fartas panículas de aromáticas flores lilases, que serão responsáveis por um outro nome pelo qual a espécie é conhecida entre nós: lilás-das-índias.

Deambulando pelos frondosos arruamentos do cemitério, fomos ao encontro de um par de imponentes nogueiras-negras, ou nogueiras-americanas (Juglans nigra), nativas do centro/este da América do Norte, de casca negra e fendida em placas e cujos frutos, ainda muito imaturos, tal como os da nogueira-comum (Juglans regia) observada no início da tarde, libertam um agradável, apesar de forte, aroma ao toque.

Caminhado ao longo de uma ensombrada alameda, ladeada por monumentais tulipeiros-da-virgínia (Liriodendron tulipifera), tivemos a oportunidade de ver os bonitos cones de coloração verde-viva levantados sobre as ramagens de vários cedros-do-líbano (Cedrus libani), bem como de admirar uma imponente olaia (Cercis siliquastrum). Nativa da região mediterrânica oriental e do Médio Oriente, esta espécie é conhecida pela sua belíssima floração primaveril, geralmente de um rosa-intenso mas que pode também ocorrer em tons de branco ou de um rosa mais pálido. Escondidas por entre a sua folhagem em forma de coração, estavam ainda, e para o nosso deleite, algumas destas bonitas flores. O prometido reencontro com as magnólias-de-flores-grandes (Magnolia grandiflora) deu-se a curta distância desta bonita olaia; e lá conseguimos, finalmente, observar as grandes flores brancas ornamentando as copas de dois magníficos exemplares da espécie.

Na secção do cemitério reservada à Ordem da Trindade, fomos de seguida admirar um solene conjunto de quatro teixos-irlandeses (Taxus baccataFastigiata‘), possivelmente um mutante do nosso teixo (Taxus baccata), de porte colunar e com origem na Irlanda do Norte.

A derradeira paragem da tarde aconteceria já muito perto da saída do cemitério, sob a ramificada copa de um deveras invulgar ginkgo, ou nogueira-do-japão, (Ginkgo biloba). Esta bela e resistente árvore, considerada um “fóssil vivo”, com raízes chinesas mas “descoberta” pelos europeus no Japão, ao contrário do que é habitual, não exibia apenas as suas características folhas em folha de leque e bilobadas, mas também uma grande profusão de estranhas folhas em forma de cone. Tratava-se, pois, de uma das muitas variedades que podemos encontrar desta espécie, e que se diferencia das demais precisamente pelas suas invulgares folhas enroladas; um Ginkgo bilobaTubifolia‘. Por entre elas, viam-se também numerosos frutos, denunciando que “este” ginkgo era na realidade “uma” ginkgo pois, sendo a espécie dioica, apresenta exemplares quer masculinos quer femininos.

Findaria, assim, mais uma tarde muito bem passada na companhia de mais algumas dos muitos milhares de árvores do Porto. No próximo dia 8 de junho iremos para poente, até ao Jardim do Passeio Alegre, conversar com outras tantas.

FOTOS | Créditos: ©2022CRE.Porto.MMourão; ©2022CRE.Porto.malmeida; ©2022João_Tenente_de_Seixas

A “Rota das Árvores do Porto” é uma iniciativa do Município do Porto integrada no FUTURO – projeto das 100.000 árvores na Área Metropolitana do Porto, e enquadra-se no projeto Florestas Urbanas Nativas no Porto – FUN Porto. Colabora o Arquiteto João Almeida.