No passado 9 de setembro, a Quinta do Seixal (Milheirós de Poiares, Santa Maria da Feira) deu-nos uma verdadeira acolhida arbórea: nos primeiros minutos do nosso encontro fomos recebidos por uma rajada de ouriços dos dois grandes castanheiros-da-índia (Aesculus hippocastanum) que franqueiam o portão de entrada. Percebemos de imediato que ali quem dita as leis são as árvores. Ficamos também a saber que as castanhas destes castanheiros não são comestíveis mas são excelentes para manter as traças afastadas da nossa roupa.

Sabíamos que naquele dia teríamos connosco um dos donos da quinta e apaixonado pelas árvores (Tiago Moreira), bem como um dos mais reputados botânicos da nossa praça – Paulo Alves – como nosso guia. O primeiro ponto de paragem da nossa visita foi o colossal cedro, motivo do primeiro debate de argumentos entre ambos. O mito enraizado na família Moreira é que aquele cedro seria o progenitor de um exemplar bem mais jovem mesmo ao lado e que é indubitavelmente um cedro-dos-Himalaias (Cedrus deodara). Mas o nosso guia – Paulo Alves – através da análise da morfologia das plantas excluiu a possibilidade dessa relação de parentesco entre ambos, bem como avançou que o centenário cedro é na verdade um híbrido entre cedro-do-Líbano (Cedrus libani) e cedro-do-Atlas (Cedrus atlantica). Depois disso, o nosso anfitrião preparou-se para descobrir outras verdades sobre a vida secreta das plantas da sua quinta 🙂

Mas antes deste ponto pudemos, através de Tiago Moreira, conhecer um pouco melhor a história do local e o nome da Quinta. Não se chama Quinta do Seixal por acaso mas porque parte dos terrenos que ocupa é dominado por seixos, calhaus, muito pouco fértil. Mas a história deste território associado à família Moreira inicia-se em 1890, altura em que os irmãos Domingos e Joaquim Alves Moreira, recém chegados do Brasil, compraram a Quinta. Na altura chamava-se “Vila Angelina” em homenagem a Angelina de Araújo Moreira, esposa de Joaquim Alves Moreira e bisavó dos atuais donos. A casa apresenta ainda características de uma “Casa Brasileira”, embora tenha sofrido alterações nos últimos anos fruto das necessidades da família. Foi em 1902 que a designação de Quinta do Seixal se consolidou, momento que está gravado num dos portões da Quinta.

Ao longo dos caminhos deste pequeno oásis fomos observando a aprendendo uma multitude de estórias e detalhes biológicos sobre os carvalhos-americanos (Quercus rubra), as criptomérias (Cryptomeria japonica), as tílias (Tilia sp.), as faias (Fagus sylvatica), entre outras espécies. Infelizmente a nossa memória não tem um décimo da capacidade da do nosso extraordinário guia, que também nos falou da importância das grandes árvores como armazéns de carbono (e ainda de outros serviços que nos podem oferecer), das relíquias paleoclimáticas – aquelas espécies que já são únicas no seu género e na sua família no território europeu, como o azevinho (Ilex aquifolium), o loureiro (Laurus nobilis), a murta (Myrtus communis), entre outras – e dos riscos das espécies invasoras.

Quando chegamos à zona da gruta (tão típica das propriedades de estilo brasileiro) tínhamos à nossa espera uma surpresa: um magnífico concerto de gongos tibetanos que cada um pôde disfrutar à sua maneira, descansando nos coloridos poufs que estavam ao nosso dispor.

Conhecemos ainda da voz do nosso guia porque no Natal se usam os azevinhos e pinheiros para fazer a decoração das casas. É um resquício da antiga cultura dos povos germânicos, que acreditavam que as árvores de folha caduca estavam dominados por espíritos malévolos durante os invernos e só as árvores de folha perene eram de confiança para levar para as suas casas como proteção. Ainda sobre os azevinhos ficamos a saber que as suas folhas estão carregadas de polissacarídeos e proteínas que evitam a congelação das folhas mas que, ao mesmo tempo, as tornam verdadeiros petiscos para os animais herbívoros. Por isso defendem-se desenvolvendo picos nas suas folhas, principalmente nas partes mais baixas, de mais fácil acesso aos animais.

Destacamos ainda os dois altíssimos tulipeiros (Liriodendron tulipifera) e a grande faia (Fagus sylvatica) na zona poente da Quinta, todos com certeza merecedores de classificação.

Terminamos o didático passeio desta tarde com um merecido descanso à sombra de um amplo carvalho-alvarinho (Quercus robur) a saborear chá de menta e fogaça, em amena conversa.

Acabamos por já não ter tempo para visitar a Capela da casa, consagrada a Santa Efigénia, padroeira de proteção contra incêndios. A lenda associada a Santa Efigénia (ou Ifigénia) envolve o Apóstolo Mateus, o vingativo rei Hírtaco e palácios em chamas. É um facto interessante o facto de esta Capela continuar a estar aberta a uso das pessoas do local, rezando-se missa nela todos os domingos às sete.

FOTOS Créditos: ©2017CRE.Porto rruiz, ©2017CRE.Porto malmeida

A “Rota das Árvores Senhoriais de Santa Maria da Feira” é uma iniciativa do Município de Santa Maria da Feira integrada no FUTURO – projeto das 100.000 árvores na Área Metropolitana do Porto. Conta com a parceria da Quinta da Murtosa, da Casa da Portela e da Quinta do Seixal e o envolvimento da Academia de Música de Paços de Brandão, da Escola Secundária de Santa Maria da Feira, da psicóloga e terapeuta de som, Cátia Duque, da cantora lírica Ana Maria Pinto e do guitarrista Rui Namora. Destaca-se a participação voluntária dos especialistas que acompanham as visitas: Luis Côrte-Real, Maria da Graça Saraiva, Paulo Alves e João Almeida.