“Quem não se ajoelha deslumbrado, em religiosa adoração ao contemplar o panorama feiticeiro que nos oferecem as Guimbras frondosas…” – o local onde começamos a última das visitas desta Rota das Árvores Senhoriais de Santa Maria da Feira é desta forma descrito, num semanário local de 1958.

Antes de nos deixarmos seduzir pela serenidade e beleza deste espaço, sabiamente guiados pelo João Almeida que tão bem nos apresentou as Guardiãs do Castelo, pudemos contemplar a verdejante encosta que, aqui e ali, começava já a mostrar o seu colorido outonal.

À vista de todos, e ainda antes de nos embrenharmos na frondosa mata, um imenso, belo e até inesperado, lódão-bastardo (Celtis australis) deu-nos as boas vindas; um singular exemplar desta espécie nativa da bacia mediterrânica e autóctone em Portugal.

Após esta primeira paragem, estávamos prontos para descobrir que outras maravilhas a mata encerraria. E logo ali ao lado estava já algo que nos chamaria a atenção; junto às cristalinas águas que brotam da fonte, datada de 1888, e irrompendo por entre as copas de um belo conjunto de aveleiras (Corylus avellana) e carvalhos-alvarinho (Quercus robur) que a rodeiam, uma altíssima e elegante palmeira-de-leque-do-México (Washingtonia robusta) indicava o caminho a seguir.

Não precisámos de subir muito para logo nos encontrarmos com um respeitável eucalipto-azul-da-Tasmânia (Eucalyptus globulus), do latim globulus, uma pequena esfera ou botão, referência à forma do opérculo do fruto. Possivelmente centenário, é o maior e mais vistoso que a mata encerra.

Depois de saborear os doces frutos do medronheiro (Arbutus unedo), à sombra de monumentais carvalhos-alvarinho (Quercus robur) fomos convidados a contemplar a energia deste local e cantar o amor no mantra africano “Ide were, were” e a natureza num mantra Indiano, acompanhados pela guitarra do Marco Silva. “O melhor dos mantras é o silêncio que fica quando se termina…” – e que bom que estava este silêncio!

Mas são muitas as atrações desta mata e havia que continuar a viagem. Azereiros (Prunus lusitanica), raros de ver em estado selvagem, um ulmeiro (Ulmus sp.) e um gigante sobreiro (Quercus suber) todos nos foram prendendo a atenção. Já quase a chegar ao castelo, um centenário freixo (Fraxinus angustifolia), o maior desta mata, aparece como que a guardá-la, não fosse esta espécie a grande árvore mítica e protetora para muitos povos da antiguidade.

Surge então o belo castelo com as suas formosas e delicadas torres. E a sombra da sua maior guardiã, um cedro-do-Líbano (Cedrus libani), fez-nos chegar mais perto, não só para atenuar o calor que fora de época nos envolvia, mas também, e quem diria, para conhecer as suas “rosas” tão delicadas.

Logo após a entrada na Quinta do Castelo, ensombrada por belos e já outonais plátanos (Platanus x hispanica), percebemos que a viagem nos levaria para terras longínquas. Uma tuia-gigante (Thuja plicata) e um conjunto de sequoias (Sequoia sempervirens), as árvores mais altas do mundo, levaram-nos até à norte-americana costa do Pacífico, para logo visitarmos o Japão, pela “mão” de dois dos seus mais belos bordos (Acer palmatum), possivelmente com mais de 100 anos, e demos ainda um saltinho à América do Sul para conhecer a butiá (Butia capitata), uma palmeira que gosta de paragens mais amenas. Tempo houve ainda para observar um sobreiro (Quercus suber) e um pinheiro-bravo (Pinus pinaster), que ternamente, e sem preconceitos, se abraçam; um curioso “monumento à tolerância”…

E continuámos viagem, perdendo-nos nos sons rebeldes dos nossos pés no tapete outonal de folhas que graciosamente iam caindo na alameda de faias-europeias (Fagus Sylvatica), e que nos conduziu novamente à América do Norte, para conhecermos três das suas muitas espécies de carvalho: o carvalho-americano (Quercus rubra), o carvalho-escarlate (Quercus coccinea) e o terceiro, menos comum em Portugal, o carvalho-das-telhas (Quercus imbricaria), cujo curioso nome provém do facto de a sua madeira ter sido utilizada na manufatura de telhas nos Estados Unidos da América.

Um colorido conjunto de tulipeiros-da-virgínia (Liriodendron tulipifera), um romântico pinheiro-manso (Pinus pinea) e um poderoso cedro-do-Oregon (Chamaecyparis lawsoniana), emolduram a vista para um dos mais belos recantos da Quinta do Castelo; o conjunto formado pela ponte, lago e monumental gruta, elementos construídos ao gosto do romântico, ainda muito presente nos nossos jardins no início do século XX. Pela sua dimensão constituem-se como um dos mais importantes no nosso país, tendo sido encomendado pelo último proprietário privado destas terras, Alexandre Brandão, à Companhia Agrícola-Hortícola do Porto que viria a realizar o projeto para a Quinta do Castelo, no terreno que herdara da sua tia “a senhora Mariquinhas do Castelo”.

A nossa viagem estava já a terminar, mas não sem antes cumprimentar um grande e solitário metrosídero (Metrosideros robusta), espécie nativa da Nova Zelândia onde lhe chamam “árvore de natal”, por ser nessa altura que floresce e se cobre de delicadas flores vermelhas. Por cá, é no verão que ela sorri, e nos deslumbra com os seus “pompons” vermelhos.

O calor e a caminhada pediam um chá refrescante que foi servido na gruta, acompanhado pelos doces típicos de Santa Maria da Feira; a fogaça e os caladinhos.

Terminámos cansados, mas com um grande sorriso nos lábios, por uma bela tarde passada na companhia das tão singulares guardiãs deste belo Castelo.

A Elisabete Charrua, participante na visita, partilha connosco a sua experiência:

Não sei o nome das árvores. Mas, no meu passeio pela Mata das Guimbras e pela Quinta do Castelo, soube olhar e vê-las, reconhecê-las pela voz do João, admirar as suas cores, aspirar os seus cheiros, ouvir os seus sons. Algumas, na sua grandiosidade, assemelhavam-se a gigantes guardas vigiando o Castelo. Outras, mais pequenas e delicadas, tentavam, sem perturbar, apanhar os raios de sol que teimavam em se esconder por entre os ramos mais altos. Não sei o nome das árvores, mas sei respeitá-las e amá-las como o sobreiro e o pinheiro que, entrelaçados, nos dão uma lição de paz e harmonia.

FOTOS: Créditos: ©CRE.Porto2017malmeida, ©2017MunicipioSantaMariaFeira

A “Rota das Árvores Senhoriais de Santa Maria da Feira” é uma iniciativa do Município de Santa Maria da Feira integrada no FUTURO – projeto das 100.000 árvores na Área Metropolitana do Porto. Conta com a parceria da Quinta da Murtosa, da Casa da Portela e da Quinta do Seixal e o envolvimento da Academia de Música de Paços de Brandão, da Escola Secundária de Santa Maria da Feira, da psicóloga e terapeuta de som, Cátia Duque, da cantora lírica Ana Maria Pinto e do guitarrista Rui Namora. Destaca-se a participação voluntária dos especialistas que acompanham as visitas: Luis Côrte-Real, Maria da Graça Saraiva, Paulo Alves e João Almeida.